A preocupação com a credibilidade da carne brasileira no mercado externo marcou a sessão da segunda-feira (20) no plenário do Senado. Os senadores citaram a Operação Carne Fraca, deflagrada na sexta-feira (17) pela Polícia Federal. As denúncias envolvem a corrupção de fiscais que facilitavam a venda de carne vendida e adulterada com produtos químicos.
A situação dos pequenos produtores que vendem os animais para os frigoríficos foi lembrada por Ana Amélia (PP-RS), Cidinho Santos (PR-MT) e José Medeiros (PSD-MT). Para os senadores, são eles que vão sentir os efeitos da desconfiança gerada pela operação.
— Sabe quem vai ser punido? Vai ser o coitado daquele pecuarista que tem as suas vaquinhas lá e para quem a esperança era vendê-las para poder sobreviver. A carne, com certeza, vai lá embaixo, não vai sobrar para pagar o capim que a vaca comeu — lamentou Medeiros.
Ana Amélia lembrou que o próprio fiscal agropecuário responsável pela denúncia, Daniel Gouveia Teixeira, disse que o número de empresas que fraudaram a qualidade dos produtos é pequeno. Para ela, é preciso uma investigação mais profunda para que se separe essa minoria e para que todo o esforço do Brasil para melhorar a qualidade das carnes não seja em vão.
Para Ana Amélia, é preciso tirar lições da operação. A primeira delas é punir exemplarmente os responsáveis para evitar que as irregularidades voltem a ocorrer. Além disso, o governo precisa ser transparente e explicar para os compradores estrangeiros e para o mercado interno o que está acontecendo.
— E a Polícia Federal, nesse processo, tem uma responsabilidade dupla, que é a agilidade na revelação das fraudes apuradas, do ponto de vista técnico e do ponto de vista da questão sanitária. Ela não pode fugir dessa responsabilidade — frisou.
Responsabilidade
Cidinho Santos criticou os responsáveis pela operação. Na opinião do senador, algumas acusações são irresponsáveis, como a que apontou a mistura de papelão ao frango. Ele lembrou que, nos áudios da operação, fica claro que o papelão era usado nas embalagens.
— Eu acho que, na verdade, carne fraca deve ter o delegado responsável por essa operação, pela irresponsabilidade. A carne fraca deve ser a dele, pela necessidade de aparecer nos holofotes e colocar a principal matriz da nossa economia brasileira na situação de vexame em que se encontra hoje perante o Brasil e perante o mundo — criticou.
Cidinho afirmou ter participação em empresas que processam a carne de aves. Para ele, o processo é muito rigoroso, o que torna difícil o cometimento de irregularidades. Na opinião dele, todas as piadas que circulam na internet sobre a carne brasileira prejudicam ainda mais os produtores.
— Muita gente brinca com piadas na internet, mas, na verdade, todos nós estamos no mesmo avião. E muita gente torce para que esse avião caia, mas, desde o produtor de milho do interior do Brasil, como o produtor de soja, como o avicultor, como o suinocultor, aquela que engorda um boi, que tira o leite de uma vaca, todos têm de começar a se preocupar, porque isso pode ter consequências terríveis para a economia do nosso País — alertou.
Audiência
O vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), senador Paulo Paim (PT–RS), quer discutir o assunto com os setores envolvidos e, principalmente, com os fiscais da vigilância sanitária. Ele apresentou requerimento nesta segunda-feira (20) e prevê que o debate aconteça no dia 28 de março. A intenção é chamar as empresas envolvidas para que elas possam dar a sua versão, além de representantes do governo e do Ministério Público.
— Isso aqui tem a ver com direitos humanos. Tudo aquilo que foi dito — vou falar em tese, porque não tenho aqui foro real — temos que esclarecer, não é? Porque estamos falando da saúde do nosso povo — disse Paim.
O senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), que deve ser indicado para presidir a Comissão de Transparência e Governança Pública (CTG), afirmou à Rádio Senado que o escândalo revelado pela Operação Carne Fraca deverá ser debatido em audiência pública pelo colegiado. O senador explicou que a CTG deve receber as atribuições de fiscalização e controle e de defesa do consumidor, com a aprovação do PRS 5/2017, em tramitação na Casa.
— O Senado tem condições de fazer alguma coisa. Já apresentei dois requerimentos para realização de audiências públicas, chamando governo federal, Ministério Público, Polícia federal, distribuidores e associação de consumidores. Temos de ouvir todo mundo, penalizar quem tem culpa — defendeu.
Indicações políticas
Ataídes disse ainda que vai apresentar projeto de lei para proibir indicações políticas de partidos para cargos na administração pública que exijam qualificação técnica. Em sua opinião, só assim será possível evitar a repetição de situações como a investigada pela Operação Carne Fraca, com a acusação de que fiscais do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) teriam recebido propina para liberar produtos como carne fora do prazo de validade e misturada com substâncias cancerígenas.